Jesus
Morre por Nós
Fazemos uma pausa esta semana para estarmos com Jesus ao morrer. Há poucos momentos de maior intimidade do que oprivilégio de estar com alguém que amamos nas últimas horas de sua vida. Queremos participar de toda a cena que rodeia a morte de Jesus e das memórias preciosas das primeiras comunidades cristãs.
Queremos também ligar o significado da morte de Jesus por nós com a realidade da nossa vida cotidiana. Queremos, conscientemente, movermo-nos, dia após dia, com um senso, cada vez mais alto, de percepção, sobre como a morte de Jesus nos dá esperança na nossa fidelidade, nossas lutas, cada dia.
Começamos, ao lermos como prece, os relatos da cena do Calvário, em Lucas e João. Imaginemos as cenas – onde escolhemos ficar em pé, para onde olhamos, ouvimos o que os outros dizem, o que sentimos. É muito importante imaginar a cena da descida da cruz e, talvez, possamos juntar-nos às pessoas que ternamente limpam o seu corpo e, logo depois, com imensa tristeza, levam-no para o túmulo. A realidade da morte está completa.
Deixemos que estas imagens ocupem o background de cada dia. Desde os primeiros pensamentos conscientes da nossa manhã até os pensamentos finais do nosso dia, deixemos que a morte de Jesus nos toque.
Estejamos especialmente conscientes de quatro áreas de nossas vidas para as quais a morte de Jesus trás vida e liberdade:
O nosso Pecado. O que fizemos, o que estamos fazendo e o que somos tentados a fazer para nos separarmos de Deus, assim como todos os aspectos em que ficamos aquém do amor que se auto-sacrifica.
A nossa Pequenez. Qualquer dos modos de sentir a morte: o nosso envelhecimento, a nossa saúde falhando, uma debilidade física, talvez a nossa morte que se aproxima, experiências que temos que são humilhantes, nossas imperfeições, o sermos rejeitados, dificuldades financeiras, tensões familiares, um relacionamento desfeito, falta de esperança, sentir-se desiludido, a experiência da depressão, a perda de uma pessoa amada.
Dificuldades com os Outros. Todos os conflitos no nosso dia a dia com pessoas difíceis que levam ao sofrimento mútuo, dores e a quebra da unidade.
O pecado no Mundo. As histórias que ocupam as manchetes e o dia a dia do mundo ao nosso redor: guerra, genocídio, desumanização das estruturas sociais, distribuição injusta da riqueza e recursos do mundo, opressão política, aborto, pedofilia, tráfico de drogas, violência insensata, pena de morte, fanatismo, demagogia, destruição do meio ambiente, desonestidade, infidelidade, avareza, consumismo.
Usemos os recursos, aqui, para nos ajudarem nesta maravilhosa semana com Jesus na sua morte por nós. Usemos as estações da Via Sacra para melhor participarmos da experiência.
À noite, agradecemos ao Senhor que nos
mostra o significado mais profundo das Boas Notícias – estamos livres do poder
do pecado e da morte sobre nós. Ao entrar completamente na nossa vida e morte,
Jesus está nas mãos de um Deus amoroso, que o levantou, e a nós também, para a
vida, redimindo todo o pecado e morte para sempre.
Passar uma semana com Jesus no Calvário não é realmente muito difícil. É uma questão de foco. Torna-se mais fácil, porque o nosso amor por Jesus cresceu nestes quatro meses. Sabemos que somos pecadores amados. Ouvimos o seu chamado para juntarmo-nos a ele na sua missão. Temos rezado com um desejo, cada vez maior, de entender a sua vida e sentimos o poder que ele tem de nos mostrar, em minuciosos detalhes, quem ele é. Agora vamos saber o quão completamente humano ele era.
Queremos ser tocados pelo significado da sua morte por nós. Esta semana não é para reflexões teológicas. É a ocasião de nos determos na realidade da morte. A nossa cultura raramente encara a realidade da morte. Distanciamo-nos da sua vivência. Apesar de estarmos cercados por morte e violência, poucos de nós viram alguém morrer ou tocaram um corpo morto para sentir o frio da ausência de vida na morte. As pessoas raramente morrem em casa, e as agências funerárias levam o corpo de uma pessoa amada, bem depressa, para embalsamá-lo, maquiar-lhe o rosto e as mãos, vesti-lo e exibi-lo como se estivesse a dormir.
Isto torna mais difícil para nós imaginarmos levantar os olhos para Jesus suspenso, a morrer de uma forma terrivelmente cruel e inacreditável de execução. E quão difícil é imaginar o seu corpo sem vida – o sinal da realidade de sua morte. Mas termos como foco, toda a manhã, o nosso desejo de estar com ele à hora da morte e as graças que temos recebido, até agora, ajudar-nos-ão a desejar segui-lo até o fim de sua vida.
Ao nos concentrarmos em cada faceta da nossa vida “tocada” pela morte de Jesus, como nos diz o Guia, ao fim do dia manifestemos a nossa gratidão – em voz alta ou por escrito. Toda a noite, a expressão de gratidão e intimidade cresce. Se tivermos uma cruz – em casa ou no quarto – habituemo-nos a olhá-la ou tocá-la com reverência. Posso ser levado (a) a traçar uma cruz na testa ou acima do coração ao acordar e antes de dormir. Tais gestos ajudam-nos a estarmos mais atentos, tanto no início quanto no fim do dia. Tal foco, pela manhã e à noite esta semana, leva-nos a caminhar ao longo do dia cada vez mais conscientes do poder da morte de Jesus para a nossa fé, esperança e caridade hoje e eu não mais olharei para uma cruz, sem me lembrar do amor que tal sinal significa para mim.
Usemos os outros recursos que nos oferecem esta semana, talvez especificamente “As Estações da Cruz” na página do retiro. Deixemos que “Para a Caminhada” e “Com estas palavras ou similares...” aprofundem, ainda mais, a experiência.
O Deus que nos criou até aqui estará
conosco para nos dar mais do que pedimos ou imaginamos. Para
a Caminhada
Nós te adoramos, Oh Cristo, te abençoamos, porque nos abraças-te ao abraçares a Cruz. Quando a dor angustia uma pessoa, lá está Jesus ajudando com palavras e gestos gentis. Observamo-lo e ouvimos as suas palavras que vêm do trono da cruz. “Perdoa-os....” Com a nossa imaginação temos o privilégio de testemunhar a declaração final de Deus sobre quem nós somos.
Vimos quão violentamente foi açoitado e coroado de espinhos. Vimo-lo cambalear ante o peso da cruz e ouvimos as palavras de escárnio ante os seus tormentos. Agora estamos com Maria onde não há violência, mas segurança. Aos pés da cruz digamos o que quisermos ou o que dizemos usualmente sobre nós mesmos. Mas tais palavras e imagens empalidecem em significado e importância quando, aos pés de Jesus, ouvimos o que ele diz sobre nós. Estamos salvos aqui, à sombra da cruz. Esta sombra anula as nossas sombras pessoais, a nossa culpa e vergonha. Pode haver alguma vergonha em nossos espíritos, fluindo da constatação de que foi preciso tudo isto para que acreditássemos o quanto amados éramos enquanto vagueávamos, desgarrados.
Quando ele está a morrer, a multidão
desiste da zombaria e sai dali para continuar a celebrar a Páscoa Judaica,
Inácio pede àqueles que fazem os exercícios para serenamente receberem, nesta segunda Eucaristia, tudo que é oferecido. Olhamos para o altar cruciforme e ponderamos sobre as palavras do profeta Isaías: “Aqui está o Servo do Senhor. Desprezado e rejeitado pelos homens, homem do sofrimento e experimentado na dor, como indivíduo de quem a gente esconde o rosto. Não valia nada, não fazíamos caso dele” (Isaías 53:3). Rezamos de mãos abertas para aceitarmos este mistério de sermos amados tanto e para sempre. Aos pés da cruz vacilamos e as nossas perguntas sobre méritos são consideradas absurdas. Observamos, escutamos, estamos em segurança e renascemos.
“Quem acreditou no que ouvimos?” (Isaías
53:1). Nós acreditamos ao nos recusarmos a virar as costas de mãos fechadas de
indignidade e vergonha. Ficamos lá até sentirmos segurança para que o descessem
da cruz. É uma resistência sagrada que assumimos estes dias de receptividade. “Eram na verdade os nossos
sofrimentos que ele carregava, eram as nossas dores, que levava às costas. E a
gente achava que ele era um castigado, alguém por Deus ferido e massacrado; “Mas ele estava a ser trespassado por causa das
nossas revoltas, esmagado pelos nossos crimes. Caiu sobre ele o castigo que nos
dá a paz; e pelas suas feridas é que fomos curados.” (Isaías
53:4).
Que aconteceu? Meu amado Jesus, como tudo chegou a este ponto? Como pode ser que eu esteja a olhar para ti pendurado aí numa inacreditável agonia? Nós aqui amontoados cheios de medo não conseguimos acreditar. A tua mãe, as outras mulheres, João. Poucos mais.
Olho para ti, contorcendo-te de dor, incapaz de respirar, puxando-te para cima pelos pulsos pregados, arfando. Vejo-te olhar para mim, com os teus olhos ardorosos, olhos que eu tão bem conheço, com o véu da dor, mas és tu ainda. Vejo-te, meu querido amigo, aquele que tem estado comigo em tantos momentos terríveis da minha vida. Agora, estou aqui contigo, incapaz. Incapaz de te ajudar.
Oh, Jesus, por quê? Por quê isto aconteceu? Racionalmente, eu sei que foi para entrares, profundamente, na minha vida e na minha dor, e na dor de todas as outras pessoas. Mas tanta dor! Como pode alguém suportá-la?
Percebo que ao estar aqui, seguro o braço
da tua mãe. Maria, que está ferida,
triste. Há tanto tempo em pé! Maria que se sentou comigo, durante horas,
enquanto eu falava contigo sobre a minha vida. Agora, vejo-a curvada pela dor.
E mal pode ficar
Ela sabe muito bem que a tua vida está se esvaindo. Olhamos para ti e rezamos e seguramo-nos uns nos outros. Somos um pequeno grupo em silêncio que te ama tanto, meu Jesus. Então, entendo que por mais que signifiques para mim, por mais que eu não queira que tu morras, não agüento ver-te sofrer. Por favor, meu Deus, deixa-o desfalecer, deixa-o morrer. Não permitas que ele sofra tanto.
Meu Jesus, continuas arfando, em busca de ar para respirares, apesar da dor torturante quando os pregos te rasgam, esgarçam os nervos dos braços. Escutamos enquanto rezas e continuas a pedir ao Pai por socorro, e então, finalmente, renderes-te. O teu corpo pálido, coberto de sujeira e sangue estremece, pela última vez, e logo fica imóvel. Maria vira-se para a irmã e cai-lhe nos braços. Não tem mais lágrimas. E nós abraçados uns aos outros, em silêncio, mudos. Os soldados chegam e descem-te o corpo que fica no chão. Maria levanta-te e segura-te nos braços.
Oh, a dor na face de Maria quando te vê! Quero ajudá-la. Quero estar lá porque sei que tu queres que eu esteja lá. Ela segura o teu corpo sem vida com todo o carinho e amor, tal qual como ela fez durante muitos anos. Olha para mim sem dizer nada, tragicamente. Encontro um jarro de água e umedeço a minha túnica. Se eu pudesse limpar-te o sangue do rosto! Se eu pudesse estancar o sangue que corre dos espinhos! Quero fazer isto para que Maria não continue a ver-te assim, com tanta dor! Maria Madalena e eu removemos os espinhos da tua cabeça e enxugamos a tua face, enquanto a tua mãe te beija.
Meu Deus, ajuda-nos. Fica conosco neste momento de dor e confusão. Jesus, ajuda-nos a entender o teu sofrimento. Ajuda-me a ver como tu és uma parte do meu sofrimento de cada dia e como este ato te ligou aos mais profundos sofrimentos de todos nós.
Obrigado, meu Deus, pela dádiva de Jesus. Obrigada, Jesus, pela tua vida na minha vida, eu sinto-a de certa forma, mesmo em meio a tudo isto.
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